2009/10/05

A Mulher do Viajante no Tempo - Audrey Niffenegger

Este título sempre me despertou alguma curiosidade cada vez que me deparava com ele, mas a verdade é que nunca me senti impelido a lê-lo... Até há 2 semanas atrás, quando vi o trailer para o filme, que deve estar por aí a estrear mais dia menos dia (acho que nos EUA já estreou) e ficar completamente confuso com aquilo tudo de ele estar casado com a mulher, mas desaparecer de vez em quando, deixando-a sozinha.

Ora bem, na semana passada fui à biblioteca e, ao fazer a pesquisa na base de dados, vi que existia lá o livro. Não resisti a trazê-lo comigo. E não é que o despachei duma assentada? Apesar de ser um livro com 400 e tal páginas, entusiasmou-me aquela ideia de Henry (a personagem principal e que viaja no tempo) viver a vida desordenadamente. Apesar de não ter percebido uma ou outra passagem do livro, tudo faz sentido! Tenho de tirar o chapéu a esta Audrey Niffenengger, porque ela realmente conseguiu ter uma ideia fantástica (a de um homem a viajar no tempo, ao encontro daquela que virá a ser a sua mulher no futuro dela, mas no presente dele) e, acima de tudo, por ter conseguido transmiti-la da melhor forma possível.

Claro que se trata de uma história romanticazeca a puxar para o melodramático lá mais para o fim (e isso vai ser enfatizado - infelizmente - no filme, com quase toda a certeza). Mas o resto está bastante interessante e podemos tirar bastante sumo destas quase-filosóficas considerações sobre as relações humanas (o amor, especificamente) inserido (ou não) no tempo cronológico.

Não sou de gostar deste tipo de romances, mas tenho de admitir que a autora me conseguiu "seduzir".

8 estrelas

2009/08/01

Contos de Beedle o Bardo - J.K. Rowling

Um livro para crianças nascido muito provavelmente graças ao último livro da série Harry Potter (uma espécie de spin off literária), no qual se fazem referências a uns contos populares infantis do mundo dos feiticeiros, nomeadamente "O Conto dos Três Irmãos", o qual tem consequências para a narrativa do livro em questão.

O que mais me agradou neste livro não foram tanto as histórias, mas sim o humor (aqui veiculado pelas notas do Professor Albus Dumbledore) a que Rowling já nos habituou na série do Harry Potter. É engraçado e lê-se num instantinho (uma hora, se tanto). Um livro que não exige muito de nós, mas que nos deixa com a sensação de saciedade por mais histórias relacionadas com o mundo mágico criado pela autora.

7 estrelas

2009/07/29

Se Isto é um Homem - Primo Levi

Relato de um italiano judeu, preso num campo de concentração perto de Auschwitz. É um retrato cru, directo e, ao mesmo tempo, simples da vida de um homem que viveu aquele horror e teve a sorte de sobreviver. Para além de descrever as atrocidades vividas/presenciadas, consegue descrever as coisas simples, as pequenas vitórias e as histórias dos que se cruzaram no seu caminho.

Esta época da História mundiasl é das que mais me horroriza e atemoriza. E, por mais filmes que veja e por mais livros que leia acerca deste tema, nunca hei-de conseguir compreender tamanha crueldade.

"Ninguém deve sair daqui, pois poderia levar para o mundo, juntamente com a marca gravada na carne, a terrível notícia do que, em Auschwitz, o homem teve coragem de fazer ao homem."

2009/07/23

O Diário de Zlata - Zlata Filipović

No geral, gostei bastante deste livro. Já tinha ouvido falar dele (quem não terá ouvido?) e tinha algum interesse em lê-lo. Acabei por ficar foi bastante surpreendido com esta "personagem" que é a Zlata Filipović, que realmente existiu e que de facto escreveu um diário que acabou por se tornar num dos mais importantes documentos da Guerra que arrasou a ex-Jugoslávia. É incrível vermos nestas páginas que uma criança de apenas 11-12 anos tinha um discernimento tão grande sobre o que a rodeava:

"Quinta-Feira, 19 de Novembro de 1992
(...) Entre os meus colegas, os meus amigos, a nossa família, há sérvios, croatas, muçulmanos. É um grupo muito misturado, e eu nunca soube quem era sérvio, quem era croata, quem era muçulmano. Agora, a política meteu o nariz e pôs um «S» nos sérvios, um «M» nos muçulmanos e um «C» nos croatas. Quer separá-los. E para escrever essas letras, usou o pior, o mais negro dos lápis. O lápis da guerra, que só escreve infelicidade e morte."

Para mim foi ainda mais interessante ler este livro, pois eu próprio, em 2007 (mais de 10 anos depois da guerra!), tive oportunidade de visitar Sarajevo e ver com os meus próprios olhos a destruição que uma guerra originada pela mesma razão estúpida de sempre (o nacionalismo, sempre o nacionalismo) provocou, levando a que inocentes sofressem desnecessariamente.

"Segunda-Feira, 29 de Junho de 1992 Dear Mimmy, ESTOU FARTA DOS TIROS DOS CANHÕES! E DOS OBUSES! E DOS MORTOS! E DO DESESPERO! E DA FOME! E DA TRISTEZA! E DO MEDO! A minha vida é isto! Não se pode criticar uma estudante inocente, de 11 anos, por querer viver. Uma estudante que já não vai à escola, que não tem alegria, que não tem as emoções dos estudantes. Uma criança que já não brinca, que não tem amigos, nem sol, nem pássaros, nem natureza, nem frutos, nem chocolates, nem bombons, só um bocadinho de leite em pó. Em resumo, uma criança que não tem infância, uma criança da guerra. Agora é que de facto compreendo que estou a viver uma guerra, que sou testemunha de uma guerra suja e repugnante (...)"

Gostei de ler este livro, por ser uma leitura em que é fácil embrenharmo-nos.

7,5 estrelas

2009/07/15

Breve História de Quase Tudo - Bill Bryson

Este livro está para a ciência como o Mundo de Sofia está para a filosofia:
dois excelentes livros que são óptimas obras introdutórias.
A Breve história tem um condão: o de nos fazer desconfiar. De nos ajudar a perceber que o que se sabe em termos de ciência é muito, muito pouco. Perceber que muitas teorias que são intocáveis para a cultura dominante são na realidade intangíveis, por falta de provas que as sustentem.

E é bom que assim seja, é saudável. Sempre que no mundo científico se teve certeza de alguma coisa só com grande esforço se conseguiu avançar, normalmente pela negação completa da crença que se tinha formado.

Confesso que já me cansam um pouco os livros de divulgação científica, porque me parecem cada vez mais parecidos uns com os outros. Cada vez mais dizem a mesma coisa e sempre a mesma coisa como se nada mais houvesse a dizer - se não havia para quê escrevê-lo?
Até os episódios anedóticos são tantas vezes os mesmos!
Por outro lado fazem falta bons livros de ciência que expliquem em linguagem simples o estado da arte nas diversas ciências. Mas era importante que fossem livros com profundidade, porque de outra forma ficamos sempre pela mesma conversa, não sentimos que adiante alguma coisa.
Este livro, fugindo àquele primeiro exemplo de livro repetitivo, também é demaisado generalista para ter a profundidade de que falo.
Nele aprendi algumas coisas e puz em causa muitas outras. É um livro inspirador, fruto de uma pesquisa enorme. E isso sente-se a par e passo.
Vale mesmo a pema lê-lo.

A última tentação de Cristo - Nikos Kazantzakis

Este livro está carregado de duas coisas que inundam a Bíblia: poesia e alegoria.
Talvez por isso mesmo, por este misturar de naturezas, tenha sido tão mal recebido pela Igreja Católica.
Não se trata de um livro histórico, nem pretende sê-lo e qualquer coincidência entre as persoagens que o habitam e as homónimas da Bíblia é mera coincidência: o seu valor é meramente simbólico.
Sendo tudo isto verdade, parece que ir buscar a história de Cristo é um abuso. Parece ter sido esse o entendimento da Igreja. Mas não. O livro é, do início ao fim, uma reflexão profunda, uma interpretação honesta da história de Cristo. Com honesta não quero dizer correcta, isso é outro assunto. Mas parece-me que o livro - e o filme - não merecia uma resposta tão primária.
Vejo no livro, como antes já tinha visto no filme, a mão de alguém que se procura aproximar de Cristo, entendê-lo profundamente. Alguns pontos são muito curiosos: Jesus fugindo a sete pés do seu destino. As figuras de Pedro, de Paulo, a propriamente dita última tentação, são bons motivos para fazer esta leitura.
Muito obrigado, Anamae!

2009/06/24

Budapeste - Chico Buarque

Um livro que conta a sua própria história. A ideia de circularidade, que tanto me agrada, revela-se no final.

Linguagem simples, fluida. Lê-se de uma assentada.

Conta-se a história de um escritor que, de forma anónima, empresta os seus escritos a outros para que estes possam publicar obras/textos de qualidade como sendo suas. Personagem contraditória, ou melhor, que vive uma contradição interior. Por um lado, gosta do anonimato mas, por outro, não suporta que os que lhe são próximos elogiem os falsos autores do trabalho que na verdade é seu. Acaba por viver num espaço algures entre a realidade e a ficção, entre aquilo que é e escreve e aquilo que representa ver ou não livros assinados com o seu nome.

Confuso? Talvez, mas garanto que o livro não deixa espaço para confusões. Definitivamente, uma agradável surpresa.

2009/06/12

Um Estranho em Goa - José Eduardo Agualusa

Livro cheio de uma mistura de culturas que nos transporta pelo mundo lusófono sem sairmos do nosso próprio sofá. Interessante e misteriosa intriga onde o narrador se vê envolvido. Ou será: onde o próprio narrador se envolve? Move-o a curiosidade.

Agradaram-me as descrições, breves mas bem direccionadas: dos locais, das pessoas/personagens, dos hábitos do dia-a-dia. São os pormenores, como a descrição de uma simples refeição por exemplo, que tornam a história verosímil, apesar de nunca sabermos ao certo se o que “vemos” desfilar à nossa frente é realidade (ainda que só na vida das personagens) ou fantasia.

Livro rico em referências bibliográficas e musicais, certamente úteis para descobrir mais um pouco acerca da Índia. Tivesse eu tempo e possibilidade de viajar fisicamente até lá e lê-los-ia e ouvi-los-ia a todos avidamente.

Encantador. No sentido original, na medida em que lança sobre nós um feitiço e nos deixa inebriados com os cheiros, o calor e os sons típicos de locais quentes como a Índia, o Brasil ou África.

“Nenhuma moeda tem apenas um lado. Assim como não há vida sem morte nem luz sem sombra, da mesma forma o bem não faz qualquer sentido se não houver o mal.”

2009/06/05

As Velas Ardem Até ao Fim - Sándor Márai

Já tinha ouvido falar deste livro (ou melhor, já tinha ouvido o título deste livro algures), apesar de não saber ao certo do que tratava. Mas por se tratar de um autor húngaro, tinha imensa curiosidade em lê-lo.

Para não estragar a surpresa a quem venha a ler o livro, não me posso alongar muito na história, podendo apenas dizer que se trata da história de uma amizade. Não de uma amizade passageira, mas sim de uma amizade profunda entre dois homens que se conheceram nos finais do século XIX, no Império Austro-Húngaro, e que se reencontram muito tempo depois.

O livro está muito bem escrito e, apesar de não parecer muito verosímil (com capítulos seguidos narrados em monólogo, o que nos faz pensar estar a ver um filme de Manoel de Oliveira ou de Ingmar Bergman), acaba por ser muito interessante, pois além de levantar algumas questões filosóficas acerca da ideia de Amizade, ainda nos faz ponderar, de maneira mais pragmática graças aos acontecimentos que depois nos são narrados, se realmente a Amizade existe e se a tudo resiste. Diria que, neste aspecto, o livro acaba por dar uma visão pessimista disso mesmo.

Em termos literários, este é um livro difícil (algumas pessoas dirão 'enfadonho'), pois não acontece (ou demora a acontecer) alguma coisa que justifique o estarmos a lê-lo. Mas como está tão bem escrito, e após a curiosidade inicial, alcançamos a velocidade de cruzeiro e só conseguimos descansar quando chegamos ao momento em que "as velas arderam até ao fim".

Gostei. Acho que este livro vale a pena!

8 estrelas

Crónica de uma Serva - Margaret Atwood

Custa-me sempre começar um livro cuja acção não se passe num tempo real. Já assim me aconteceu com Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley. No entanto, depois de ultrapassado esse obstáculo, percebem-se a ironia do texto e as “lições” que dele podemos tirar, por exemplo, no que diz respeito ao modo como nos relacionamos com os outros e ao modo como usamos levianamente a liberdade de que dispomos.

Porém, neste livro, com uma história original passada numa época futura, pós-feminista, apreciei sobretudo a estrutura. Há uma comunicação constante entre a narradora participante e quem a lê/ouve. Esta técnica agrada-me sempre. E há, ainda, o relato dos acontecimentos, que têm lugar no tempo da acção, intercalado com o relato das memórias da personagem que, inevitavelmente, nos fazem reflectir sobre o papel da mulher na sociedade.

2009/05/16

O Velho que Lia Romances de Amor - Luis Sepúlveda

E ao terceiro livro que leio de Sepúlveda, rendo-me. Agora sim, percebo por que razão é tão falado este livro (e por que tanta gente gosta dele e de Sepúlveda).

No passado li História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar (um livro com uma mensagem universalista de tolerância para os que são diferentes de nós, mais direccionado para o público infantil) e também Encontro de Amor num País em Guerra (um livro com diversos contos sobre variadíssimos temas, especialmente o amor), mas nenhum me tinha feito fica absolutamente fã do autor. Com este O Velho que Lia Romances de Amor Luis Sepúlveda conseguiu surpreender-me e muito!

Encontramos aqui a história de uma aldeiazinha perdida nos confins da selva amazónica, onde habita um velho viúvo que gosta de ler romances de amor, daqueles "de chorar rios de lágrimas" e "com pessoas que se amam mesmo" e ainda que "sofrem muito", mas sempre com "desfechos felizes". As peripécias vão levar a que este velho, conhecedor da selva, seja obrigado a internar-se nela para trazer paz aos restantes habitantes de El Idilio. Mas com uma forte consciência ecológica e de respeito pela natureza, ele nunca mais será o mesmo depois de cumprir a sua missão.

Não sei se se pode dizer que há nesta história alguns ecos do mais que famoso O Velho e o Mar (não só no título, mas também na demanda levada a cabo por ambos os velhos), mas devo dizer que enquanto o livro do Hemingway não me diz nada, o livro de Sepúlveda conseguiu cativar-me completamente.

10 estrelas

2009/04/16

Cândido - Voltaire

Este foi um dos livros mais divertidos que li nos últimos tempos. Nele, Voltaire insurge-se contra o optimismo simplista e as utopias.

«- Que é isso de optimismo? - perguntou Cacambo.
- Ai! - respondeu Cândido -, é a teimosia de sustentar que tudo está bem quando tudo está mal.»

É interessantíssimo ver a crítica mordaz do filósofo francês à "metafísico-teológico-cosmolólogonigologia" (visando sobretudo os filósofos alemães Leibniz e Wolff) e satirizando a ideia de que «quantos mais males particulares houver, mais o bem geral aumentará», visto que «as coisas não podem ser de outra maneira: porque, tendo tudo sido feito para um fim, necessariamente o foi para o melhor dos fins». Curioso é também a personagem principal, no seu périplo pelo mundo, chegar à cidade de Lisboa no fatídico dia 1 de Novembro de 1755 e assistir ao famoso terramoto.

«Enfim, menina, tenho experiência, conheço o mundo. Podeis entreter-vos a pedir a todos os passageiros do navio que contem a sua história, e não encontrareis um só que não maldiga a sua vida e se não julgue muitas vezes o mais infeliz dos homens. Se assim não for, deitem-me ao mar de cabeça para baixo.»

Só não leva mais estrelas, porque sinceramente estava à espera de um livro um bocadinho melhor (tal era a expectativa que tinha em relação a ele) e não tão semelhante ao O Ingénuo.

7 estrelas

2009/04/07

À Procura de Sana - Richard Zimler

Como apreciador da saga Zarco que sou, não posso dizer que este livro me tenha empolgado tanto como O Último Cabalista de Lisboa, Goa ou o Guardião da Aurora e, claro, A Sétima Porta.

No geral, gostei. Na realidade, não tinha grande curiosidade em ler este livro, mas após alguma "insistência" de uma amiga (que me disse para o ler, mas que me avisou que não era tão bom como os outros), decidi-me a dar-lhe alguma atenção. Pelo facto de não estar à espera de uma grande obra literária, as expectativas acabaram por ser superadas.

É uma história um bocado complexa (e a determinadas alturas um pouco desinteressante, especialmente quando é narrada a história da infância de Sana, por exemplo), mas o senhor Zimler já nos habituou a isso mesmo, não é verdade? O que acabou por me cativar mais neste livro foi mais o "ambiente" do que propriamente a história da busca de Sana. Ou seja, achei bastante interessante o retrato das relações entre palestinianos e israelitas e tudo o que está implicado, mais do que do resto (telefonemas e viagens para aqui e para ali e sei lá mais o quê). Quem gosta do Zimler, não se sentirá defraudado com este livro. Mas a quem não conhecer (ou não gostar), não recomendo que este seja um primeiro livro.

7 estrelas

2009/04/06

O Último Minuto na Vida de S. - Miguel Real

A grande interrogação que surge quando lemos o título deste livro é: mas afinal, que significará aquele "ésse ponto"? O que será, ou melhor, quem será, a pessoa a que se refere aquela letra?

Ainda demoramos algum tempo a perceber quem será "ésse ponto" mas após as primeiras pistas, não restam dúvidas. Para não estragar a surpresa a futuros leitores (porque julgo que um dos méritos do livro é precisamente fazer-nos descobrir que personagem é), só posso dizer que é surpreendente a revelação da pessoa que é e que nunca será nomeada no texto (nem ela, nem as pessoas mais próximas que a acompanham), mas de que todos já ouvimos falar quase de certeza, por esta ser uma história sobejamente conhecida.

E no entanto... No entanto, o que não é sobejamente conhecido é o amor que vemos retratado ao longo das páginas deste livro, um amor fortíssimo, mas condenado a não sobreviver. Num espaço de 60 segundos, a vida de "ésse ponto" passa-lhe à frente dos olhos, misturando passado com presente, até ao momento derradeiro. Este é um livro para ler com atenção, não fosse ele também o retrato de um Portugal mergulhado numa ditadura e incapaz de se modernizar (europeízar) após da queda da mesma.

Já tinha ouvido falar de Miguel Real, mas não tinha grande curiosidade em ler nada dele. Agora sei que isso era um erro, pois acabei por ficar bastante surpreendido com a maneira de escrever dele e, só por isso, valeu a pena o tempo que lhe dediquei. E fiquei com vontade de ler mais (apesar de os outros livros parecerem romances históricos pesadões) - Quem sabe se também quanto a isso não estarei igualmente enganado?

7 estrelas

2009/03/17

Nocturno Indiano - Antonio Tabucchi

«- Mas não é um romance - protestei eu -, é um bocado aqui outro ali, não há sequer uma verdadeira história, são apenas fragmentos de uma história (...)»

Este foi o segundo livro que li de Antonio Tabucchi e, apesar de não ter gostado tanto como o Afirma Pereira (mas acho que isso seria muito difícil...), foi uma leitura muito interessante. A narrativa é contada de uma forma que me atraiu particularmente, já que nós, enquanto leitores, somos completamente apanhados desprevenidos à medida que vamos avançando de capítulo em capítulo. Isso acontece especialmente no capítulo final. Acho que é precisamente isso que destaco (essa capacidade de nos deixar completamente desorientados, como se nós próprios estivéssemos a realizar naquele momento uma viagem, tal qual o "protagonista", não do ponto de vista físico ao subcontinente indiano, mas uma viagem à narrativa desordenada daquelas personagens), a par de raras serem as explicações que nos são fornecidas. Afinal, o que faz aquele Português na Índia? E por que razão foi aquele Italiano atrás dele? Quem são Isabel e Magda? Serão aqueles dois homens amigos, ou isso é coisa do passado? Este é um livro de interrogações que não têm resposta. Só nos é dado ver o que «está dentro da moldura» e não nos é dado ver o que aconteceu para lá dela.

A Índia presta-se muito a este tipo de exercício, não é? O de ir em busca de uma identidade que se desconhece ou que está oculta. Esta história fez-me precisamente recordar alguns filmes que já tive oportunidade de ver e que se podem relacionar com ela (The Darjeeling Limited, Lezioni di Volo, etc.) e até mesmo alguns livros que já li.

Entre as 8 e as 9 estrelas

2009/03/05

Não matem o bébé! - Kenzaburo Oé

É difícil falar deste livro sem dizer toda a história, porque a história não é muita.
O livro não trata de um dilema, embora ele esteja sempre presente e acabe por se resolver. Ao mesmo tempo é um livro onde as decisões, as motivações as intenções nunca são inteiramente explícitas, embora o pareçam. Fica sempre algo mais, algo por dizer, algo por fazer. Nunca pode ser tão simples, apesar de obstinadamente o ser, de sucessivamente o ser. Até que.
E mais não posso dizer. Talvez isto não seja muito claro, talvez seja estranho, mas é assim mesmo, este livro, estranho. O livro exibe um distanciamento por parte dos personagens que não parece ser muito normal, no entanto todas as personagens o parecem assumir como se fosse. Então das duas uma: ou todo o livro é pura e simplesmente inverosímil, o que me parece difícil de aceitar, ou mostra uma mentalidade de fundo muito diversa daquela a que estamos habituados. Acredito mais nisto, e isso é o que mais me impressionou, o que mais fica desta leitura: uma mentalidade muito diferente.

2009/03/03

A sombra do Vento - Carlos Ruiz Zafon

Este livro deixa-me sentimentos muito diversos. Por um lado é um livro com pormenores muito interessantes: o Cemitério dos Livros Esquecidos, o Fermin, dão um colorido delicioso ao livro. Por outro lado há algumas inconsistências, alguns non sequitur que eram bem escusados. O pai de Daniel é uma figura apagadíssima e embora esperemos sempre, a qualquer momento, uma revelação, ela nunca acontece. Por outro lado, o prometido é de vidro: o Cemitério é secretíssimo mas o Daniel fala dele a torto e a direito. Também Fumero acaba por ser uma figura absolutamente plana e desinteressante, parece roubados aos vilões de banda desenhada. E é uam pena, porque ela representa um tipo de personagem que merecia outro tratamento, outra reflexão, outra profundidade, pelo peso que tem na memória colectiva espanhola, como aliás na portuguesa.Ao mesmo tempo há alguns pormenores da história algo previsíveis. Mas desses não posso dizer mais sem dizer tudo. Por outro lado descrições que variam entre o perfeito e o excessivo, sendo que a linha é, por vezes ténue. É apenas um dos aspectos queirosiano deste romance. E mais não digo a este propósito. Gostei de o ler e, sendo o primeiro livro que leio do autor, espero que outros livros venham a confirmar o muito que este livro apenas promete. Obrigado à Pentax.

8/10 estrelas

2009/02/11

Notas de cozinha de Leonardo da Vinci - Shelag & Jonathan Routh

Gostei muito deste livro. Ele contém uma introdução geral, que fala de Leonardo da Vinci e da respectiva época e que dá um belíssimo mote para a leitura que se segue. Quanto ao Código em si, trata-se de um livro da época de Leonardo e que lhe é atribuído, embora não tenha ainda sido possível estabelecer com certezas a autoria. Gostei muitíssimo de o ler, por muitas razões. Em primeiro lugar, porque nos dá uma ideia de época muito interessante: o que se comia, como se comia, como se organizavam os castelos, o modo de vida. Em segundo lugar, pelo vislumbre do despontar de determinados utensílios de todos os dias, coisas que sempre ali estiveram mas que um dia foram "inventadas". Por último, pela visão muito curiosa da vida de Leonardo. Acho que todos nós somos conduzidos para a imagem do génio, de um Leonardo que não falha nada, que faz os desenhos mais perfeitos, mais subtis, mais fantásticos mesmo num vulgar bloco de notas. Um Leonardo que inventa uma coisa nova todos os dias, uma peça central de onde deriva toda a cultura europeia, de uma ou de outra forma. Este livro mostra um Leonardo diferente, mais humano, que apesar das muitas falhas que teve nunca deixou de tentar. Acredito que foi isso que fez a sua magnitude.

2009/02/10

O Carteiro de Pablo Neruda - Antonio Skármeta

A literatura sul-americana tem destas coisas: quando menos estamos à espera, consegue surpreender-nos pelos melhores motivos.

Este foi, sem dúvida, o melhor livro que li durante o mês de Janeiro. Aliás, passou já para a lista das recomendações, onde estão todos os livros que considero que valem a pena serem lidos. Antonio Skármeta tem uma fantástica capacidade em contar uma história simples, mas ternurenta, vvalendo-se de uma linguagem castiça e que prende desde o início ao fim. O livro tem o tamanho ideal. Felizmente que Skármeta teve consciência em não se alongar demasiado, correndo o risco de tornar maçadora uma história tão bela, acerca da admiração de um carteiro pelo poeta mais famoso do seu país... Ou será da admiração do poeta mais famoso do seu país pelo seu carteiro (um pobre de espírito, mas com um rico coração)?

10 estrelas.

2009/01/24

A Vida Secreta das Abelhas - Sue Monk Kidd

Bem, sempre que olhava para a estante, não sei porquê, este livro sobressaía em relação aos outros... Acho que o título me estava a deixar bastante curioso, por isso não resisti a pegar-lhe e a lê-lo duma assentada.

E não é que me surpreendeu? Não sei bem do que é que estava à espera de encontrar nestas páginas, mas de facto as minhas expectativas foram sobejamente superadas. Se primeiro pensava que era um livro levezinho e mais direccionado para o público feminino, enganei-me. Esta história de Sue Monk Kidd vai mais longe do que aquilo que se está à espera, especialmente graças ao pano de fundo histórico utilizado pela autora: década de 60 na Carolina do Sul (um dos Estados segregacionistas e mais racistas dos EUA). As personagens são vítimas de preconceito e injustiça (que hoje nos parecem absolutmanete ridículos e que custa a acreditar que há apenas 50 anos era o que acontecia na principal nação "civilizadora" do mundo). Acho que foi isso que acabei por apreciar mais no livro todo.

Depois temos a parte mais romântica da história: Lily e a sua demanda pela felicidade. Claro que acaba tudo por soar a cliché, além de parecer demasiado folhetinesco e inverosímil, mas pronto, nada que não consigamos perdoar à Sue Monk Kidd, pois, apesar de uma ou outra passagem menos bem conseguida, ela até tem jeito a contar a história.

Concluindo: não dei o tempo a ler este livro como mal empregue, pois no fundo fiquei surpreendido pela história que conta. Não é o meu livro favorito de sempre, mas acho que o relembrarei um dia mais tarde como um livro interessante.

8 estrelas

2009/01/19

Passeios Aleatórios pela ciência do dia a dia - Nuno Crato

Este livro contém diversas crónicas originalmente publicadas no Expresso. São muito interessantes e contêm curiosidades que não sabia. Mas é um livro relativamente pobre, uma obra de divulgação que fica pela superficialidade típica das crónicas de meia dúzia de linhas semanais. Não está em causa a grande qualidade do Nuno Crato como comunicador - que é patente - está em causa mais uma vez a diferença abissal entre um livro de ciência e uma colectânea de crónicas, que a meu ver deveria ser bem identificadas como tal na capa.

2009/01/18

O Périplo de Baldassare - Amin Maalouf

Acabei hoje mesmo de ler um livro de um autor com cujo nome me tenho deparado com muita frequência ultimamente. E foi sem dúvida uma leitura bastante agradável.

O livro conta a história de um homem que parte numa viagem pelo Mediterrâneo (e não só) em busca de um livro que atenuará os efeitos nefastos do Ano da Besta (1666). Este é o mote para que Amin Maalouf nos faça viajar pelas superstições europeias e médio-orientais, reconstituindo, não com grande rigor, mas ainda assim de forma satisfatória, todo o ambiente social, cultural e resligioso de meados do século XVII, na Europa e especialmente no Médio Oriente, dominado pelos Otomanos.

Claro que parece um pouco irrealista que a viagem de Baldassare seja motivada apenas pela crença supersticiosa de que um livro salve aquele que o possui, e além disso os acontecimentos que impelem o nosso protagonista a viajar cada vez para mais longe sucedem-se de forma algo inverosímil ou até mesmo folhetinesca. Mas conseguimos perfeitamente perdoar isso ao nosso amigo Maalouf, pois se há coisa em que ele tem jeito, é a narrar uma história e, por mais inverosímil que seja, não desilude em nada.

8 estrelas

2009/01/17

Uma Casa no Fim do Mundo - Michael Cunningham

Bem, devo dizer que ler este livro foi como um murro no estômago. Achei-o um bocadinho superior ao As Horas (livro do mesmo autor, bem mais famoso graças ao filme do mesmo nome e que valeu a Nicole Kidman o Óscar de melhor actriz em 2002), que também já tive oportunidade de ler, e que é, apesar de tudo, igualmente original.

A primeira parte desta livro foi a que realmente me surpreendeu pela forma como os acontecimentos são narrados... Se bem que na segunda parte continuam a ser abordados temas polémicos (SIDA, comportamentos sexuais promíscuos, o amor entre três pessoas, duas delas do mesmo sexo), julgo que não está tão bem arranjada como a primeira, o que torna o ritmo do livro um pouco mais lento, ainda que não necessariamente menos interessante.

No que respeita às personagens, Clare foi a que me pareceu menos verosímil, aquela que tinha uma identidade mais fictícia e sem a profundidade da personagem de Jonathan ou de Alice. Também Bobby acabou por me desiludir um pouco, pois estava à espera que fosse ele a personagem-chave da narrativa. No entanto, devo dizer que, se calhar, o mérito de Michael Cunningham está precisamente no facto de não haver uma personagem que se sobreponha às restantes e cada uma, à sua maneira, constrói uma história contada na primeira pessoa, mas em diferentes perspectivas, como a construção lenta de um puzzle. De facto, admiro qualquer autor que consegue a proeza de escrever um livro inteiro na primeira pessoa do singular, sendo que este Uma Casa no Fim do Mundo vai ainda mais longe com quatro eus a desenrolar o emaranhado novelo da(s) sua(s) vida(s).

Nota especial ainda para o facto da importância das músicas que vão sendo referidas ao longo do livro. É interessante ir confrontando a letra de cada uma com a parte da história em que está inserida para perceber que não foram ali postas ao acaso.

Sem dúvida que este Michael Cunningham foi uma agradável surpresa. Há já muito tempo que um autor americano não me surpreendia desta maneira (acho que o Dan Brown e companhia nos fazem esquecer que os EUA também têm bons escritores).

Por todas essas razões, acho que este é um livro bastante interessante e que vale a pena ler.

9 estrelas

2009/01/15

Os 12 livros que tenciono ler em 2009

Este ano tenciono ler, não necessariamente por esta ordem:

1. Guerrilla Learning, John Gatto
2. A última tentação de Cristo, Nikos Kazantzakis
3. O meu Michael, Amos Oz
4. Não matem o bébé, Kenzaburo Oé
5. Os Jardins da memória, Ohran Pamuk
6. Cultivo de Setas y Trufas, Garcia Rollan
7. Plantas Silvestres Comestibles
8. Breve História de Quase Tudo, Bill Bryson
9. A matemática das coisas, Nuno Crato
10. Este ofício de poeta, Jorge Luís Borges
11. Diário I, Miguel Torga
12. Do Espiritual na Arte, Wassily Kandinsky
13. Para Sempre, Vergílio Ferreira
14. A Terra e o Cosmos, Isac Asimov
15. O rochedo de Tanios, Amin Maalouf
16. O Guia do Pai, Kevin Nelson
17. O que farias se tivesses um pincel mágico que desse vida a tudo o que pintasses?, Jane M. Healy
18. Breve História dos Tractores em Ucraniano, Marina Lewycka
20. Sputnik, Meu Amor, Haruki Murakami
21. A vida do Irmão Roger, Kathryn Spink
22. Santo António de Lisboa, Ervino Helmle
23. A ilusão da economia, Karl Polanyi
24. Religião, Estado e Martírio no Islão, Ira M Lapidus e Farhad Khosrokhavar
25. Conversas no Adro da Igreja, JacquesGaillot e Eugene Drewermann
26. Ética, Espinosa
27. Minha vida e minhas experiencias com a verdade, Mohandas Karamchand Gandhi

2009/01/14

2009 Aqui vamos nós!

Os meus objectivos literários para este ano:

Desfazer-me da TBR* sem que isso signifique necessariamente desfazer a tbr, ou seja, ler os livros.

Eleger 12 livros que não quero deixar de ler este ano e lê-los.

Ler mais livros de ciência, filosofia e humanidades, por contraposição à ficção.

Ler pelo menos 2 livros por mês, de preferência 3. Seria extraordinário se chegasse a 1 por semana.

Fazer bons comentários, ainda a fresco, quer nas JE´s quer no Companhia das Letras.

* tbr é a lista de livros para ler (to be read). Reservo essa designação para os livro do Bookcrossing.