2009/03/17

Nocturno Indiano - Antonio Tabucchi

«- Mas não é um romance - protestei eu -, é um bocado aqui outro ali, não há sequer uma verdadeira história, são apenas fragmentos de uma história (...)»

Este foi o segundo livro que li de Antonio Tabucchi e, apesar de não ter gostado tanto como o Afirma Pereira (mas acho que isso seria muito difícil...), foi uma leitura muito interessante. A narrativa é contada de uma forma que me atraiu particularmente, já que nós, enquanto leitores, somos completamente apanhados desprevenidos à medida que vamos avançando de capítulo em capítulo. Isso acontece especialmente no capítulo final. Acho que é precisamente isso que destaco (essa capacidade de nos deixar completamente desorientados, como se nós próprios estivéssemos a realizar naquele momento uma viagem, tal qual o "protagonista", não do ponto de vista físico ao subcontinente indiano, mas uma viagem à narrativa desordenada daquelas personagens), a par de raras serem as explicações que nos são fornecidas. Afinal, o que faz aquele Português na Índia? E por que razão foi aquele Italiano atrás dele? Quem são Isabel e Magda? Serão aqueles dois homens amigos, ou isso é coisa do passado? Este é um livro de interrogações que não têm resposta. Só nos é dado ver o que «está dentro da moldura» e não nos é dado ver o que aconteceu para lá dela.

A Índia presta-se muito a este tipo de exercício, não é? O de ir em busca de uma identidade que se desconhece ou que está oculta. Esta história fez-me precisamente recordar alguns filmes que já tive oportunidade de ver e que se podem relacionar com ela (The Darjeeling Limited, Lezioni di Volo, etc.) e até mesmo alguns livros que já li.

Entre as 8 e as 9 estrelas

2009/03/05

Não matem o bébé! - Kenzaburo Oé

É difícil falar deste livro sem dizer toda a história, porque a história não é muita.
O livro não trata de um dilema, embora ele esteja sempre presente e acabe por se resolver. Ao mesmo tempo é um livro onde as decisões, as motivações as intenções nunca são inteiramente explícitas, embora o pareçam. Fica sempre algo mais, algo por dizer, algo por fazer. Nunca pode ser tão simples, apesar de obstinadamente o ser, de sucessivamente o ser. Até que.
E mais não posso dizer. Talvez isto não seja muito claro, talvez seja estranho, mas é assim mesmo, este livro, estranho. O livro exibe um distanciamento por parte dos personagens que não parece ser muito normal, no entanto todas as personagens o parecem assumir como se fosse. Então das duas uma: ou todo o livro é pura e simplesmente inverosímil, o que me parece difícil de aceitar, ou mostra uma mentalidade de fundo muito diversa daquela a que estamos habituados. Acredito mais nisto, e isso é o que mais me impressionou, o que mais fica desta leitura: uma mentalidade muito diferente.

2009/03/03

A sombra do Vento - Carlos Ruiz Zafon

Este livro deixa-me sentimentos muito diversos. Por um lado é um livro com pormenores muito interessantes: o Cemitério dos Livros Esquecidos, o Fermin, dão um colorido delicioso ao livro. Por outro lado há algumas inconsistências, alguns non sequitur que eram bem escusados. O pai de Daniel é uma figura apagadíssima e embora esperemos sempre, a qualquer momento, uma revelação, ela nunca acontece. Por outro lado, o prometido é de vidro: o Cemitério é secretíssimo mas o Daniel fala dele a torto e a direito. Também Fumero acaba por ser uma figura absolutamente plana e desinteressante, parece roubados aos vilões de banda desenhada. E é uam pena, porque ela representa um tipo de personagem que merecia outro tratamento, outra reflexão, outra profundidade, pelo peso que tem na memória colectiva espanhola, como aliás na portuguesa.Ao mesmo tempo há alguns pormenores da história algo previsíveis. Mas desses não posso dizer mais sem dizer tudo. Por outro lado descrições que variam entre o perfeito e o excessivo, sendo que a linha é, por vezes ténue. É apenas um dos aspectos queirosiano deste romance. E mais não digo a este propósito. Gostei de o ler e, sendo o primeiro livro que leio do autor, espero que outros livros venham a confirmar o muito que este livro apenas promete. Obrigado à Pentax.

8/10 estrelas