2008/01/11

A Relíquia - Eça de Queirós

Caros amigos da Companhia das Letras. Depois de ter sido convidado pelo NCD a colaborar com este blog (o que tentarei fazer sempre que achar conveniente), aqui fica o meu primeiro contributo. A ideia deste espaço é precisamente a troca de ideias e opiniões sobre as leituras que vamos fazendo, por isso não se acanhem e comentem, rebatam, divirtam-se acima de tudo.

Que rica Relíquia que Eça nos oferece nestas pouco mais de 250 páginas. Como de resto, já nos tem habituado em todos os outros seus livros, o autor escreve de maneira absolutamente irrepreensível. A adjectivação inesperada, a crítica social, seja ela directa (através da boca das personagens) ou indirecta (através dos próprios actos das personagens em determinadas situaçõeS), veio reforçar a ideia de que este é realmente um dos meus autores portugueses preferidos de sempre.

No entanto, temo bem que este não seja o livro de Eça de Queirós que mais gostei de ler até hoje. Para isso, contribuiu grande parte do corpo central do livro, especialmente a "jornada ao passado" (como lhe chama Topsius), ou seja, o sonho do Teodorico Raposo à Jerusalém de Jesus. Toda a narração é, sem desprimor para a capacidade narrativa de Eça, maçadoramente desinteressante. Exceptua-se apenas a sua parte final, em que um Eça descrente e ateu, republicano e liberal, narra "a lenda inicial do Cristianismo", o mesmo é dizer a (não) ressureição de Cristo.

Este Teodorico Raposo, a personagem principal, é sem dúvida uma das personagens mais castiças que já tive oportunidade de conhecer. Um fanfarrão, muito orgulhoso das suas barbas viris, mulherengo inveterado, mas mais convencido que bem sucedido (como acabam por demonstrar as infidelidades das mulheres com quem vai conseguindo ter relações amorosas), mas acima de tudo, é ridiculamente cómico. A única coisa que chega a chocar mais nesta personagem rocambolesca é o facto de ser tão interesseiro ao ponto de querer "apressar a obra lenta da morte", chegando mesmo a dar-lhe ganas de "espancar aquela velha". É verdade que ninguém merece uma tia como aquela "horrenda" D.Patrocínio, mas desejar tal sorte à senhora, teria como inevitável desfecho aquele que realmente acaba por suceder. Ainda vemos, quase no fim da história, uma espécie de redenção do ilustre mentiroso, mas não é que Teodorico, mesmo depois de ser visitado pela própria consciência, não aprendeu a lição? (Como não poderia deixar de ser, ou não fosse Eça o mestre na descrição das ironias - pelo menos daquelas em que nos deixamos cair - da vida).

8 estrelas

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