2008/04/12

A Morte Melancólica do Rapaz Ostra & Outras Estórias - Tim Burton

Li este livro de uma assentada, claro! Escusado será dizer que gostei bastante (conhecendo já uma grande parte do trabalho cinematográfico de Tim Burton, sou aquilo a que se pode chamar um praticamente-fã do realizador). É incrível como Tim Burton consegue criar estas histórias (e não estórias como vem na capa do livro - fica a nota feita) de inadaptados que no fundo não têm culpa nenhuma de o ser. Pior mesmo só o facto de serem a maior parte das vezes rejeitados pelos próprios pais e, no fim, por todos os que os rodeiam. Nenhuma das histórias termina com um final feliz. Não há qualquer tipo de redenção e acho que é isso mesmo que diferencia o Tim Burton de todos os outros. Trata os assuntos da morte e da dor tão prosaicamente como outro qualquer autor/realizador trataria o tema do amor. É a inversão quase total dos valores que estamos acostumados a aceitar como garantidos. Aqui não há amor, há o contrário do amor, há "desamor"... Nem os pais amam os seus filhos (num dos contos, chega-se mesmo ao absurdo máximo que é o próprio pai comer o filho para se curar de um problema de impotência), desajustados do mundo sem culpa alguma ("O Rapaz Robô", "A Morte Melancólica do Rapaz Ostra", "O Rapaz Múmia", "O Bebé Âncora") nem os inadaptados amam quem os ama a eles ("A Rapariga Lixo") ou, se os amam, é um amor impossível ("Palitinho e Fosforina Apaixonados", "A Rapariga Vodu"). E há os que são simplesmente inadaptados e vivem (e/ou morrem) sozinhos e tristes ("O Rapaz Nódoa", "A Rapariga que se Transformou numa Cama", "Roy, o Rapaz Pesticida", "A Rainha das Almofadas de Alfinetes", Cabeça de Melancia", "Crispim, o Hediondo Rapaz Pinguim", "O Rapaz Torresmo"). Estranho é igualmente o facto de algumas histórias serem ambientadas na época do Natal, precisamente aquela em que supostamente estamos mais sensíveis aos actos de caridade e amor.

Nota especial também para as ilustrações que ajudam a complementar os poemas (ou será que são os poemas que complementam as ilustrações?). Muito interessante este livro.

7 estrelas

2008/04/06

A Praia - Alex Garland

Demorei mais tempo a acabar este livro do que aquele que à partida seria necessário, mas isso deveu-se ao facto de me ter deixado levar calmamente pela escrita deste Alex Garland. Convenhamos: esta não é uma grande obra-prima literária (nem pouco mais ou menos), mas está escrita de tal forma que nos deixa agarrados desde a primeira frase até à última, muito graças à quantidade incrível de acontecimentos. Por estas razões, não é de estranhar que passado tão pouco tempo após a publicação deste livro, ele tenha sido adaptado ao cinema. E percebe-se perfeitamente que foi escrito no início da década de 90, graças às referências a filmes e especialmente aos jogos de vídeo: quem não se lembra de jogar o Street Fighter, o Super Mario ou o Sonic? Além disso, é ali abordado um tema que começou a tornar-se pertinente naquela altura e que hoje sentimos cada vez mais na pele, que é o do turismo de massa (a este propósito, as observações de Richard no que respeita a ser um viajante são também muito interessantes e dignas de nota).

Infelizmente já vi o filme protagonizado pelo Leonardo DiCaprio mais de uma vez, por isso esta leitura foi sempre um bocado contaminada pelas imagens e pelo que eu já sabia que ia acontecer. No entanto, foi sempre deixado espaço à surpresa, na medida em que nem tudo foi mantido igual na transposição para o grande ecrã. Além disso, consegui perfeitamente dissociar a imagem do Leonardo ao Richard! Preferi muito mais o Richard britânico e moreno do que o americano loiro e de olhos azuis. Em todo o caso, e acho que isto só acontece porque já tinha visto o filme antes de ler o livro - caso contrário seria um feroz crítico de tamanhas liberdades - não acho que as alterações tenham desvirtuado muito a história. Bem, talvez exceptue desta observação os apontamentos românticos e sexuais que não existem na versão literária, o que não deixa de mostrar que o filme foi feito mais a pensar em encher o olho aos adolescentes com as hormonas aos saltos do que propriamente para bem da Sétima Arte.

Julgo que este livro não deva ser incluído junto daqueles que tratam sobre a intrínseca maldade humana (tal como O Deus das Moscas), como me fizeram crer quando mo aconselharam. No entanto, não deixa de surpreender um pouco a violência dos capítulos finais. A única personagem com quem simpatizei verdadeiramente foi Étienne, o mais sensato do grupo. Todos os outros me pareceram excêntricos (Unhygienix), calculistas (Sal), desinteressantes (Keaty), loucos (Richard). Estranho é também a associação que Alex Garland faz entre a Praia e a Guerra do Vietname, fazendo surgir do nada (ou melhor, da loucura de Richard) a personagem Daffy. Sinceramente, acho que não cheguei a perceber muito bem essa associação...

Quanto à ideia de viver num sítio paradisíaco longe de tudo e de todos pode ser bastante apelativa, mas não sei se gostaria de passar pela experiência. Talvez por um curto espaço de tempo fosse interessante, mas poderia tornar-se rapidamente aborrecido. Além disso, como fica ali provado, o paraíso de facto não existe.

7 estrelas